sábado, 23 de janeiro de 2010

Presbiterato e vestes talares

Um presbítero da Igreja Presbiteriana Independente do Brasil me mandou, recentemente, um scrap no Orkut, perguntando o seguinte:

Quanto às vestes talares de pastores e leigos, lembro-me (se não me falha a memória) que você indicou um "link" onde mostrava modelos das vestes. Minha pergunta é justamente o que foi discutido na comunidade "Liturgia" a respeito das vestes e o uso pelos Presbíteros, já que a vestimenta está associada ao título de quem a veste, ou seja, Reitor, Reverendo, Juiz, etc. e se para o presbítero poderia haver uma toga que diferenciasse das demais. Desde já, agradeço.



Bom, vamos por partes. O costume cristão bi-milenar é de que todos quantos tenham uma participação na condução do culto estejam trajados de modo a identificá-los como servos consagrados para essas tarefas. É por isso que em igrejas católicas romanas, ortodoxas orientais, anglicanas e luteranas, tanto os ministros como também o coro e os auxiliares (acólitos, ou "coroinhas") sempre tenham uniformes que os identifiquem como tal.

Para mim, isso não é clericalismo, ou uma negação do sacerdócio universal de todos os santos; é apenas um uniforme que identifica quem vai fazer o quê. Isso nivela os participantes, que não serão mais vistos ou identificados por seu gosto (bom ou mau) para roupas, ou pior, pelo seu nível social, perceptível nas marcas que se usa. Eu fiquei extremamente desconfortável na minha adolescência, quando participava do conjunto musical dos jovens, quando alguém da igreja comentou que parecia que só podia subir à frente e participar do conjunto quem vestisse roupas de griffe. E, se parecia, era porque era isso mesmo que se via; tirando eu, que, adolescente desleixado, só vestia calça jeans e camiseta Hering, o resto do povo (especialmente as meninas) parecia pronto para ir desfilar no shopping (que acontecia com freqüência depois do culto). Mas o que importa é que ninguém está ali para se mostrar, ou para ostentar seus gostos e posses pessoais. Por isso, o uniforme ajuda.

Mas tornemos à pergunta do amigo presbítero. Tecidas essas considerações sobre os uniformes dos servos que lideram o culto, isso fica ainda mais patente quanto aos presbíteros. Na minha infância, era comum que todos os presbíteros vestissem terno e gravata para a Santa Ceia. Até os anos 80, era uma coisa uniforme. Mas dos anos 90 para frente, quando mudou a moda no corte dos ternos, ficava aquela coisa ridícula (clique nas palavras para ver do que estou falando): ternos xadrez, quadriculados, gravatas berrantes que eram curtas demais ou compridas demais, com aquelas lapelas que chegavam nos ombros... Enfim, os presbíteros viraram motivo de riso, porque, fora de moda como estavam, pareciam palhaços! E por conta disso, abandonou-se completamente o uso do terno por eles, em todas as igrejas que eu conheço! O efeito disso é fazer parecer que os sacramentos não são mais tão importantes assim, pois para participar da sua ministração, eles estão vindo vestidos casualmente. Um presbítero (atualmente, pastor) que eu conheço, muito gente boa e cuja filha eu já paquerei (hehe), chegou ao ponto de ir de camisa havaiana florida. "Anunciais a morte do Senhor até que ele venha" passou longe desse dia...

Na minha opinião, é interessante que haja um uniforme também para os presbíteros regentes, que reflita que os sacramentos e ritos sacramentais dos quais eles participam (Sagrado Batismo, Sagrada Eucaristia, Profissão de Fé, Ordenação e, em alguns casos, a Unção dos Enfermos) são, em primeiro lugar, atos importantes na vida cristã e, em segundo lugar, atos da Igreja de Cristo (que têm o poder de ligar na terra e no céu, e desligar na terra e no céu).

Mas qual uniforme?

A toga preta no corte de Genebra tem sido reservada, como o amigo consulente mencionou, para aqueles que desempenham o papel de presidência: Reitores, Juízes e Ministros do Evangelho. Em algumas igrejas (sobretudo anglicanas reformadas), os Mestres-de-Capela, embora não sejam sempre ordenados, também a usam. Mas não tenho notícia de presbíteros regentes usando-a.

Vamos, então, nos voltar para a Igreja Cristã bi-milenar.

Na igreja dos primeiros séculos, criou-se o costume dos recém-batizados trajarem-se usando um talar branco, de mangas justas e gola redonda. Essa era a roupa mais formal em uso no Império Romano; em geral, usava-se togas mais curtas, às vezes mesmo sem mangas, como já cansamos de ver nos filmes. Essa túnica talar era especialmente formal, para uso em ocasiões especiais. Por isso, seu uso pelos recém-batizados: eles acabavam de ser incorporados à Igreja de Cristo, e isso, naqueles tempos de perseguição, parecia ter um significado bem mais forte do que hoje infelizmente se vê.

Esse traje foi uma das coisas que a Igreja Católica Romana conservou, apesar das mudanças da moda que as invasões bárbaras ocasionaram (uso de calças e calçados fechados, por exemplo...). É, ainda hoje, vestido nas igrejas (católicas e protestantes, indistintamente) que conservam a tradição cristã ocidental. É a chamada alba, ou alva (foto abaixo).



Ela não é de uso exclusivo de ministros ordenados, mas pode ser usada por todos aqueles que foram batizados em nome da SS. Trindade. Ela é, ainda hoje, usada como a primeira camada de pano dos padres católico-romanos, anglo-católicos e luteranos de high-church, e fica por baixo da casula, como eu já disse no primeiro post do blog.

Então eu creio que a alba é uma boa pedida para ser a base do uniforme dos presbíteros regentes. Mas não só ela.

Como a alba é de uso comum por todos os batizados (e eu acho curioso notar que, de todos os não-conformistas, justamente os batistas conservem o seu uso original, como roupa batismal!), talvez seja interessante adicionar um elemento distintivo, que indique à primeira vista qual a função do servo que a está usando.

Aqui, eu sou a favor do uso da estola de presbítero. Explico-me.

Na tradição da igreja ocidental, geralmente se reconhecem dois ofícios ordenados (diácono e presbítero) e um ofício consagrado (bispo hierárquico). Cada um deles tem a alba como vestimenta-base, mas cada um tem, também, acessórios que permitem identificar prontamente quem é o quê.

O bispo, por exemplo, por cima da alba veste casula e copa (uma espécie de capa), usa um chapéu conhecido como mitra e carrega na mão um cajado chamado báculo. Abaixo, uma foto do Bispo Diocesano de Paisley, na Inglaterra, e seu filho, que é deão da mesma catedral (obviamente, na Igreja Anglicana).


O diácono, por cima da alba veste a sua estola, que tem um design próprio, pendendo de um dos ombros e presa à ponta do lado oposto. Usada deste jeito, ela representa o serviço, lembrando a toalha de que o Senhor Jesus se cingiu para lavar os pés dos Apóstolos (foto abaixo).


Já a estola do presbítero (até a Reforma Protestante, não existia a diferenciação entre presbítero docente e regente) pende livremente, pendurada pelo pescoço. Ela representa o jugo do Senhor Jesus, que é suave (relembrando que "jugo" é sinônimo de canga, a peça que prende o boi para puxar o carro ou o arado). Serve também para lembrar o seu usuário de que ele é servo, e não senhor. Por isso, também prefiro as estolas simples, de tecido liso e bordado discreto, aos festivais de fios de ouro e brocados que se viam na Idade Média.

Interesante notar que, mesmo na conservadoríssima Presbyterian Church of America, muitos ministros têm trocado a toga genebrina pela alba, mantendo a estola. Abaixo, foto de dois ministros da PCA (no púlpito, o Rev. Jeff Meyers, de cujo site tenho tirado muita, mas muita coisa boa, confiram!).


Pois a minha proposta, para os presbíteros que estão a fim de adotar um uniforme, tanto para destacar a natureza eclesiástica da sua função (não é um casamento de cartório, não é uma audiência no fórum, para se usar terno e gravata) como para ressaltar a sua importância (porque não se vai de calça jeans e camiseta pólo para nada importante), é justamente essa: a alba com estola. Não está invadindo a prerrogativa exclusiva de ninguém (como seria se eles resolvessem vestir a toga de Genebra) e ainda respeita 2000 anos de tradição cristã!

Fonte: http://liturgiareformada.blogspot.com/2008/07/presbiterato-e-vestes-talares.html

segunda-feira, 18 de janeiro de 2010

A subutilização do Evangelho gera o arminianismo e o pentecostalismo (Parte II)

Infelizmente as velhas e novas heresias são atraentes pelo seu poder em priorizar as questões de “poderes, cura e mercado”. A formação lobo-pastoral prioriza a “inovação” como um ingrediente vital para o sucesso de uma igreja, como se fosse um negócio. Se o povo está sedento por “milagres econômicos” ou curas, os lobos identificam a oportunidade e realizam uma estratégia de marketing religioso. Se uma igreja consegue lotar galpões de “fiéis”, outros lobos analisam o “produto” da concorrência e propõe novos “produtos” para captar mais fiéis. E assim vira uma bola de neve, sem trocadilho. Tal mentalidade eclesiástica é fundamental para lidar com a concorrência religiosa. Sob este viés a igreja é pensada como uma estratégia empresarial. Agem como cães que não temem o que está escrito em Gálatas 6.7: Não vos enganeis: de Deus não se zomba; pois aquilo que o homem semear, isso também ceifará.

Seguindo o planejamento estratégico diabólico de crescimento de “igreja-negócio” a oportunidade atual identificada para explorar os fiéis é o neopentecostalismo , o pentecostalismo e o arminianismo, alguns são mais fervorosos que outros, mas todos, em certa medida, não fazem bom uso da prudência cristã bíblico-doutrinária e detêm a verdade. -- Ó homens, até quando tornareis a minha glória em vexame, e amareis a vaidade, e buscareis a mentira? (Salmos 4:2).

A teologia contemporânea acabou com as confissões de fé, com os cânones, com a boa exegese, com a interpretação histórico-gramatical, com o Princípio Regulador de Culto, os valores tradicionais bíblicos, a teologia clássica e perene. O que vale é a “teologia de liquefação”, instantânea fusão, efêmera, mutante, customizada ao sabor dos infiéis. As igrejas querem ser agradáveis a todo custo, tornam-se personalizadas, cada um crê de um jeito diferente e ao seu modo e gosto. Tudo é válido e espirituoso. É muito provável que, Deus, segundo os exemplos da história da Igreja, manifeste uma reação à altura dessa inquietação efêmera revertendo todo esse cenário para a Sua glória. Oremos por um avivamento genuíno! -- Até quando, ó néscios, amareis a necedade? E vós, escarnecedores, desejareis o escárnio? E vós, loucos, aborrecereis o conhecimento? (Provérbios 1:22).

Deus certamente acabará com os excessos e o “algo mais” dessa geração incrédula. Sua poderosa mão abolirá os ruídos e interferência de Sua majestosa Palavra. Deus pode e varrerá essa instabilidade, porque a boca do SENHOR o disse. Saberemos quando entrarmos num verdadeiro avivamento quando o SENHOR varrer o arminianismo, pentecostalismo e neo-pentecostalismo da face da terra, pois, [Deus] destróis os que proferem mentira (Salmos 5:6).

O certo é que a igreja Atual passa por um momento sem precedentes na sua história devido a pluralidade e o caos das teologias. Mas graças ao Eterno que essa “sujeira evangélica” não encobriu a visão de toda igreja, -- Reservei para mim sete mil homens, que não dobraram os joelhos diante de Baal (Romanos 11:4), -- há pregadores, teólogos, escritores e irmãos multiplicadores que não se deixaram contaminar ao ponto de perder o foco da mensagem que impacta e muda a vida dos eleitos. Os propagadores da boa teologia e do bom caminho, antes de tudo, são formadores de conceitos e opiniões.

Faz parte da competência da boa teologia, reconhecer e combater os modismos, as tendências antibíblicas, comparar os pontos de vista histórico, cultural e social das gerações. As velhas heresias vão ganhando novas roupagens, e a atual geração de evangélicos vêm reproduzindo formas de misticismos e arminianismo, que sem dúvida prevalecem. Hoje em dia, raramente se busca produzir pregações e estudos bem estruturados exegeticamente, ricos em doutrinas fundamentais da fé cristã, “tal coisa é trivial”, pensa a massa evangélica. O que eles não sabem é que estão apenas reproduzindo heresias já condenadas por cânones bíblicos. A teologia pós-moderna não passa de rebelião, negando a Suficiência das Escrituras. Nesse momento, a teologia sólida e perene passa a ser ignorada como algo estranho e transforma-se em interpretações aleatórias e independentes, porém ao mesmo tempo dependente do repertório e do gosto da massa evangélica confiante. Tais não ouvem Jeremias 7.4 que diz: Não confieis em palavras falsas, dizendo: Templo do SENHOR, templo do SENHOR, templo do SENHOR é este.

A Igreja não precisa de uma teologia baseada na desordem, na irracionalidade e falta de coerência, ele não precisa de pastores psicólogos que pregam de forma intuitiva e comunicam somente amenidades aos ouvintes. Deus requer de seus profetas que quebrem muitos paradigmas CONTRA O MUNDO e não que inovem em sua Palavra. Não precisamos de um novo Evangelho. O respeito, a reverência e o temor ao estudar e propagar o Evangelho é a marca característica dos genuínos pregadores.



Frases para meditar:

“Tão grande é a depravação do homem não-regenerado que, embora não
haja nada que ele necessite mais do que o evangelho,
não há nada que ele deseje menos”.
R. B. Kuiper



“Se você crê somente no que gosta do evangelho e rejeita o que não gosta,
não é no evangelho que você crê, mas, sim, em si mesmo”.
Agostinho

A subutilização do Evangelho gera o arminianismo e o pentecostalismo (Parte I)

Assim diz o SENHOR: Ponde-vos à margem no caminho e vede, perguntai pelas veredas antigas, qual é o bom caminho; andai por ele e achareis descanso para a vossa alma; mas eles dizem: Não andaremos.
(Jeremias 6:16)

Não esperamos nenhum novo mundo em nossa astronomia nem nenhuma nova Bíblia em nossa teologia.
Augustus H. Strong


O cenário evangélico atual é algo bem distinto da herança da Reforma Protestante. Hoje se fala muito em “poder, cura, batalha espiritual e vitória financeira”, mas na verdade é ínfimo o potencial que se está utilizando das Escrituras nas igrejas contemporâneas, em sua maioria. Quase toda pregação no presente é subjetiva, superficial e ilusória, mas não por isso impopular. Pelo contrário, de tão pop influencia as igrejas antes tradicionais -- presbiterianas, congregacionais e batistas. -- O arminianismo e o pentecostalismo com seus tentáculos midiáticos e seu forte sectarismo abraçam praticamente todos os pontos de pregação. O que muitos não atentam é que nem sempre foi assim e que é preciso retornar às antigas veredas em busca de obediência e temor.

Não precisa ir muito longe para captar bons exemplos de igrejas. Décadas atrás a sistematização doutrinária pregada nos púlpitos era mais harmoniosa doutrinariamente, simples e prática. Porém a condição pós-moderna impôs uma convivência com a pluralidade, a fragmentação, a heterogeneidade e contradições sem igual. De tempos em tempos nasce um novo modismo, transitório como fogo de palha. Muitos pregadores que seguiram ou seguem este “fogo estranho” exalam sua fumaça presentemente, e os “adoradores” em “carne e em mentira” amam aspirá-la.

A variedade de estilos das manifestações doutrinárias mina a harmonia doutrinária ortodoxa e confessional do protestantismo histórico. A bandeira evangélica contemporânea para um observador externo é complexa, cheia de contradições, incertezas e simulações inquietantes. Os evangélicos ironizam e rejeitam suas próprias raízes. As premissas sólidas são simplesmente jogadas no lixo como algo não prioritário. O espírito antidogmático reina e todos adormecem na sonolência da irracionalidade. Doutrinas apostólicas perenes e universais são consideradas heresias pelos seguidores de “novos apóstolos” e suas seitas. Há quase 500 anos Lutero já dizia: “Qualquer ensinamento que não se enquadre nas Escrituras deve ser rejeitado, mesmo que faça chover milagres todos os dias”, hoje se diz o inverso e com “autoridade”.

Nunca foi tão válida a expressão “os fins justificam os meios”, a igreja pós-moderna focaliza-se nos modos e meios de representações que provêm das experiências subjetivas dos evangélicos e fazem disso sua formação “doutrinária”. A teologia de hoje não tem uma estrutura sólida e bem construída, ela é muito mais uma “demolidora irresponsável” e desconstrucionista. A identidade evangélica é fluida, plural, paródia e fragmentação dos antigos cristãos, apoiada em fundamento de areia das novas roupagens das velhas heresias. O protestantismo histórico deve retomar seu protesto contra tais coisas pensando na Igreja da próxima geração, como frisou Francis Schaeffer: “Se não tornarmos clara nossa posição, com palavras e obras, em favor da verdade e contra as falsas doutrinas, estaremos edificando um muro entre a próxima geração e o evangelho”.

sábado, 23 de janeiro de 2010

Presbiterato e vestes talares

Um presbítero da Igreja Presbiteriana Independente do Brasil me mandou, recentemente, um scrap no Orkut, perguntando o seguinte:

Quanto às vestes talares de pastores e leigos, lembro-me (se não me falha a memória) que você indicou um "link" onde mostrava modelos das vestes. Minha pergunta é justamente o que foi discutido na comunidade "Liturgia" a respeito das vestes e o uso pelos Presbíteros, já que a vestimenta está associada ao título de quem a veste, ou seja, Reitor, Reverendo, Juiz, etc. e se para o presbítero poderia haver uma toga que diferenciasse das demais. Desde já, agradeço.



Bom, vamos por partes. O costume cristão bi-milenar é de que todos quantos tenham uma participação na condução do culto estejam trajados de modo a identificá-los como servos consagrados para essas tarefas. É por isso que em igrejas católicas romanas, ortodoxas orientais, anglicanas e luteranas, tanto os ministros como também o coro e os auxiliares (acólitos, ou "coroinhas") sempre tenham uniformes que os identifiquem como tal.

Para mim, isso não é clericalismo, ou uma negação do sacerdócio universal de todos os santos; é apenas um uniforme que identifica quem vai fazer o quê. Isso nivela os participantes, que não serão mais vistos ou identificados por seu gosto (bom ou mau) para roupas, ou pior, pelo seu nível social, perceptível nas marcas que se usa. Eu fiquei extremamente desconfortável na minha adolescência, quando participava do conjunto musical dos jovens, quando alguém da igreja comentou que parecia que só podia subir à frente e participar do conjunto quem vestisse roupas de griffe. E, se parecia, era porque era isso mesmo que se via; tirando eu, que, adolescente desleixado, só vestia calça jeans e camiseta Hering, o resto do povo (especialmente as meninas) parecia pronto para ir desfilar no shopping (que acontecia com freqüência depois do culto). Mas o que importa é que ninguém está ali para se mostrar, ou para ostentar seus gostos e posses pessoais. Por isso, o uniforme ajuda.

Mas tornemos à pergunta do amigo presbítero. Tecidas essas considerações sobre os uniformes dos servos que lideram o culto, isso fica ainda mais patente quanto aos presbíteros. Na minha infância, era comum que todos os presbíteros vestissem terno e gravata para a Santa Ceia. Até os anos 80, era uma coisa uniforme. Mas dos anos 90 para frente, quando mudou a moda no corte dos ternos, ficava aquela coisa ridícula (clique nas palavras para ver do que estou falando): ternos xadrez, quadriculados, gravatas berrantes que eram curtas demais ou compridas demais, com aquelas lapelas que chegavam nos ombros... Enfim, os presbíteros viraram motivo de riso, porque, fora de moda como estavam, pareciam palhaços! E por conta disso, abandonou-se completamente o uso do terno por eles, em todas as igrejas que eu conheço! O efeito disso é fazer parecer que os sacramentos não são mais tão importantes assim, pois para participar da sua ministração, eles estão vindo vestidos casualmente. Um presbítero (atualmente, pastor) que eu conheço, muito gente boa e cuja filha eu já paquerei (hehe), chegou ao ponto de ir de camisa havaiana florida. "Anunciais a morte do Senhor até que ele venha" passou longe desse dia...

Na minha opinião, é interessante que haja um uniforme também para os presbíteros regentes, que reflita que os sacramentos e ritos sacramentais dos quais eles participam (Sagrado Batismo, Sagrada Eucaristia, Profissão de Fé, Ordenação e, em alguns casos, a Unção dos Enfermos) são, em primeiro lugar, atos importantes na vida cristã e, em segundo lugar, atos da Igreja de Cristo (que têm o poder de ligar na terra e no céu, e desligar na terra e no céu).

Mas qual uniforme?

A toga preta no corte de Genebra tem sido reservada, como o amigo consulente mencionou, para aqueles que desempenham o papel de presidência: Reitores, Juízes e Ministros do Evangelho. Em algumas igrejas (sobretudo anglicanas reformadas), os Mestres-de-Capela, embora não sejam sempre ordenados, também a usam. Mas não tenho notícia de presbíteros regentes usando-a.

Vamos, então, nos voltar para a Igreja Cristã bi-milenar.

Na igreja dos primeiros séculos, criou-se o costume dos recém-batizados trajarem-se usando um talar branco, de mangas justas e gola redonda. Essa era a roupa mais formal em uso no Império Romano; em geral, usava-se togas mais curtas, às vezes mesmo sem mangas, como já cansamos de ver nos filmes. Essa túnica talar era especialmente formal, para uso em ocasiões especiais. Por isso, seu uso pelos recém-batizados: eles acabavam de ser incorporados à Igreja de Cristo, e isso, naqueles tempos de perseguição, parecia ter um significado bem mais forte do que hoje infelizmente se vê.

Esse traje foi uma das coisas que a Igreja Católica Romana conservou, apesar das mudanças da moda que as invasões bárbaras ocasionaram (uso de calças e calçados fechados, por exemplo...). É, ainda hoje, vestido nas igrejas (católicas e protestantes, indistintamente) que conservam a tradição cristã ocidental. É a chamada alba, ou alva (foto abaixo).



Ela não é de uso exclusivo de ministros ordenados, mas pode ser usada por todos aqueles que foram batizados em nome da SS. Trindade. Ela é, ainda hoje, usada como a primeira camada de pano dos padres católico-romanos, anglo-católicos e luteranos de high-church, e fica por baixo da casula, como eu já disse no primeiro post do blog.

Então eu creio que a alba é uma boa pedida para ser a base do uniforme dos presbíteros regentes. Mas não só ela.

Como a alba é de uso comum por todos os batizados (e eu acho curioso notar que, de todos os não-conformistas, justamente os batistas conservem o seu uso original, como roupa batismal!), talvez seja interessante adicionar um elemento distintivo, que indique à primeira vista qual a função do servo que a está usando.

Aqui, eu sou a favor do uso da estola de presbítero. Explico-me.

Na tradição da igreja ocidental, geralmente se reconhecem dois ofícios ordenados (diácono e presbítero) e um ofício consagrado (bispo hierárquico). Cada um deles tem a alba como vestimenta-base, mas cada um tem, também, acessórios que permitem identificar prontamente quem é o quê.

O bispo, por exemplo, por cima da alba veste casula e copa (uma espécie de capa), usa um chapéu conhecido como mitra e carrega na mão um cajado chamado báculo. Abaixo, uma foto do Bispo Diocesano de Paisley, na Inglaterra, e seu filho, que é deão da mesma catedral (obviamente, na Igreja Anglicana).


O diácono, por cima da alba veste a sua estola, que tem um design próprio, pendendo de um dos ombros e presa à ponta do lado oposto. Usada deste jeito, ela representa o serviço, lembrando a toalha de que o Senhor Jesus se cingiu para lavar os pés dos Apóstolos (foto abaixo).


Já a estola do presbítero (até a Reforma Protestante, não existia a diferenciação entre presbítero docente e regente) pende livremente, pendurada pelo pescoço. Ela representa o jugo do Senhor Jesus, que é suave (relembrando que "jugo" é sinônimo de canga, a peça que prende o boi para puxar o carro ou o arado). Serve também para lembrar o seu usuário de que ele é servo, e não senhor. Por isso, também prefiro as estolas simples, de tecido liso e bordado discreto, aos festivais de fios de ouro e brocados que se viam na Idade Média.

Interesante notar que, mesmo na conservadoríssima Presbyterian Church of America, muitos ministros têm trocado a toga genebrina pela alba, mantendo a estola. Abaixo, foto de dois ministros da PCA (no púlpito, o Rev. Jeff Meyers, de cujo site tenho tirado muita, mas muita coisa boa, confiram!).


Pois a minha proposta, para os presbíteros que estão a fim de adotar um uniforme, tanto para destacar a natureza eclesiástica da sua função (não é um casamento de cartório, não é uma audiência no fórum, para se usar terno e gravata) como para ressaltar a sua importância (porque não se vai de calça jeans e camiseta pólo para nada importante), é justamente essa: a alba com estola. Não está invadindo a prerrogativa exclusiva de ninguém (como seria se eles resolvessem vestir a toga de Genebra) e ainda respeita 2000 anos de tradição cristã!

Fonte: http://liturgiareformada.blogspot.com/2008/07/presbiterato-e-vestes-talares.html

segunda-feira, 18 de janeiro de 2010

A subutilização do Evangelho gera o arminianismo e o pentecostalismo (Parte II)

Infelizmente as velhas e novas heresias são atraentes pelo seu poder em priorizar as questões de “poderes, cura e mercado”. A formação lobo-pastoral prioriza a “inovação” como um ingrediente vital para o sucesso de uma igreja, como se fosse um negócio. Se o povo está sedento por “milagres econômicos” ou curas, os lobos identificam a oportunidade e realizam uma estratégia de marketing religioso. Se uma igreja consegue lotar galpões de “fiéis”, outros lobos analisam o “produto” da concorrência e propõe novos “produtos” para captar mais fiéis. E assim vira uma bola de neve, sem trocadilho. Tal mentalidade eclesiástica é fundamental para lidar com a concorrência religiosa. Sob este viés a igreja é pensada como uma estratégia empresarial. Agem como cães que não temem o que está escrito em Gálatas 6.7: Não vos enganeis: de Deus não se zomba; pois aquilo que o homem semear, isso também ceifará.

Seguindo o planejamento estratégico diabólico de crescimento de “igreja-negócio” a oportunidade atual identificada para explorar os fiéis é o neopentecostalismo , o pentecostalismo e o arminianismo, alguns são mais fervorosos que outros, mas todos, em certa medida, não fazem bom uso da prudência cristã bíblico-doutrinária e detêm a verdade. -- Ó homens, até quando tornareis a minha glória em vexame, e amareis a vaidade, e buscareis a mentira? (Salmos 4:2).

A teologia contemporânea acabou com as confissões de fé, com os cânones, com a boa exegese, com a interpretação histórico-gramatical, com o Princípio Regulador de Culto, os valores tradicionais bíblicos, a teologia clássica e perene. O que vale é a “teologia de liquefação”, instantânea fusão, efêmera, mutante, customizada ao sabor dos infiéis. As igrejas querem ser agradáveis a todo custo, tornam-se personalizadas, cada um crê de um jeito diferente e ao seu modo e gosto. Tudo é válido e espirituoso. É muito provável que, Deus, segundo os exemplos da história da Igreja, manifeste uma reação à altura dessa inquietação efêmera revertendo todo esse cenário para a Sua glória. Oremos por um avivamento genuíno! -- Até quando, ó néscios, amareis a necedade? E vós, escarnecedores, desejareis o escárnio? E vós, loucos, aborrecereis o conhecimento? (Provérbios 1:22).

Deus certamente acabará com os excessos e o “algo mais” dessa geração incrédula. Sua poderosa mão abolirá os ruídos e interferência de Sua majestosa Palavra. Deus pode e varrerá essa instabilidade, porque a boca do SENHOR o disse. Saberemos quando entrarmos num verdadeiro avivamento quando o SENHOR varrer o arminianismo, pentecostalismo e neo-pentecostalismo da face da terra, pois, [Deus] destróis os que proferem mentira (Salmos 5:6).

O certo é que a igreja Atual passa por um momento sem precedentes na sua história devido a pluralidade e o caos das teologias. Mas graças ao Eterno que essa “sujeira evangélica” não encobriu a visão de toda igreja, -- Reservei para mim sete mil homens, que não dobraram os joelhos diante de Baal (Romanos 11:4), -- há pregadores, teólogos, escritores e irmãos multiplicadores que não se deixaram contaminar ao ponto de perder o foco da mensagem que impacta e muda a vida dos eleitos. Os propagadores da boa teologia e do bom caminho, antes de tudo, são formadores de conceitos e opiniões.

Faz parte da competência da boa teologia, reconhecer e combater os modismos, as tendências antibíblicas, comparar os pontos de vista histórico, cultural e social das gerações. As velhas heresias vão ganhando novas roupagens, e a atual geração de evangélicos vêm reproduzindo formas de misticismos e arminianismo, que sem dúvida prevalecem. Hoje em dia, raramente se busca produzir pregações e estudos bem estruturados exegeticamente, ricos em doutrinas fundamentais da fé cristã, “tal coisa é trivial”, pensa a massa evangélica. O que eles não sabem é que estão apenas reproduzindo heresias já condenadas por cânones bíblicos. A teologia pós-moderna não passa de rebelião, negando a Suficiência das Escrituras. Nesse momento, a teologia sólida e perene passa a ser ignorada como algo estranho e transforma-se em interpretações aleatórias e independentes, porém ao mesmo tempo dependente do repertório e do gosto da massa evangélica confiante. Tais não ouvem Jeremias 7.4 que diz: Não confieis em palavras falsas, dizendo: Templo do SENHOR, templo do SENHOR, templo do SENHOR é este.

A Igreja não precisa de uma teologia baseada na desordem, na irracionalidade e falta de coerência, ele não precisa de pastores psicólogos que pregam de forma intuitiva e comunicam somente amenidades aos ouvintes. Deus requer de seus profetas que quebrem muitos paradigmas CONTRA O MUNDO e não que inovem em sua Palavra. Não precisamos de um novo Evangelho. O respeito, a reverência e o temor ao estudar e propagar o Evangelho é a marca característica dos genuínos pregadores.



Frases para meditar:

“Tão grande é a depravação do homem não-regenerado que, embora não
haja nada que ele necessite mais do que o evangelho,
não há nada que ele deseje menos”.
R. B. Kuiper



“Se você crê somente no que gosta do evangelho e rejeita o que não gosta,
não é no evangelho que você crê, mas, sim, em si mesmo”.
Agostinho

A subutilização do Evangelho gera o arminianismo e o pentecostalismo (Parte I)

Assim diz o SENHOR: Ponde-vos à margem no caminho e vede, perguntai pelas veredas antigas, qual é o bom caminho; andai por ele e achareis descanso para a vossa alma; mas eles dizem: Não andaremos.
(Jeremias 6:16)

Não esperamos nenhum novo mundo em nossa astronomia nem nenhuma nova Bíblia em nossa teologia.
Augustus H. Strong


O cenário evangélico atual é algo bem distinto da herança da Reforma Protestante. Hoje se fala muito em “poder, cura, batalha espiritual e vitória financeira”, mas na verdade é ínfimo o potencial que se está utilizando das Escrituras nas igrejas contemporâneas, em sua maioria. Quase toda pregação no presente é subjetiva, superficial e ilusória, mas não por isso impopular. Pelo contrário, de tão pop influencia as igrejas antes tradicionais -- presbiterianas, congregacionais e batistas. -- O arminianismo e o pentecostalismo com seus tentáculos midiáticos e seu forte sectarismo abraçam praticamente todos os pontos de pregação. O que muitos não atentam é que nem sempre foi assim e que é preciso retornar às antigas veredas em busca de obediência e temor.

Não precisa ir muito longe para captar bons exemplos de igrejas. Décadas atrás a sistematização doutrinária pregada nos púlpitos era mais harmoniosa doutrinariamente, simples e prática. Porém a condição pós-moderna impôs uma convivência com a pluralidade, a fragmentação, a heterogeneidade e contradições sem igual. De tempos em tempos nasce um novo modismo, transitório como fogo de palha. Muitos pregadores que seguiram ou seguem este “fogo estranho” exalam sua fumaça presentemente, e os “adoradores” em “carne e em mentira” amam aspirá-la.

A variedade de estilos das manifestações doutrinárias mina a harmonia doutrinária ortodoxa e confessional do protestantismo histórico. A bandeira evangélica contemporânea para um observador externo é complexa, cheia de contradições, incertezas e simulações inquietantes. Os evangélicos ironizam e rejeitam suas próprias raízes. As premissas sólidas são simplesmente jogadas no lixo como algo não prioritário. O espírito antidogmático reina e todos adormecem na sonolência da irracionalidade. Doutrinas apostólicas perenes e universais são consideradas heresias pelos seguidores de “novos apóstolos” e suas seitas. Há quase 500 anos Lutero já dizia: “Qualquer ensinamento que não se enquadre nas Escrituras deve ser rejeitado, mesmo que faça chover milagres todos os dias”, hoje se diz o inverso e com “autoridade”.

Nunca foi tão válida a expressão “os fins justificam os meios”, a igreja pós-moderna focaliza-se nos modos e meios de representações que provêm das experiências subjetivas dos evangélicos e fazem disso sua formação “doutrinária”. A teologia de hoje não tem uma estrutura sólida e bem construída, ela é muito mais uma “demolidora irresponsável” e desconstrucionista. A identidade evangélica é fluida, plural, paródia e fragmentação dos antigos cristãos, apoiada em fundamento de areia das novas roupagens das velhas heresias. O protestantismo histórico deve retomar seu protesto contra tais coisas pensando na Igreja da próxima geração, como frisou Francis Schaeffer: “Se não tornarmos clara nossa posição, com palavras e obras, em favor da verdade e contra as falsas doutrinas, estaremos edificando um muro entre a próxima geração e o evangelho”.